1-3: Estrutura e Circução Atmosférica

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Eugene S. Takle
© 1996

A maioria dos estudantes que estão neste curso não tem conhecimento profundo de meteorologia, portanto assume-se que alguns princípios básicos precisam ser mencionados. Algumas características da estrutura e da circulação atmosférica são necessárias para se entender como o ambiente está mudando. A atmosfera transporta rapidamente calor, umidade, e gases, e ela é uma camada muito fina quando comparado ao raio da Terra. Para entender seus movimentos é preciso começar pelo Sol que fornece a energia para que tanto a atmosfera como os oceânos se movimentem.

A Terra descreve uma órbita eliptica ao redor do Sol ficando mais próxima (1,47 108 km) em Dezembro, e esta posição é chamada de periélio. Isso ocorre durante o verão no hemisfério sul (solstício de verão). Em Junho, a distância é maior chegando a 1,52 108 km, sendo denominada de afélio (solstício de inverno). Os pontos intermediários são chamados de equinócios (dia e noite com mesma duração), e ocorrem na primavera e no outono. A excentricidade de sua órbita é de 0,016. A Terra tem um plano de inclinação de 23,5° em relação plano de sua órbita ao redor do Sol.


A Terra no afélio e periélio.
(Lutgens, F.K., and Tarbuck E. J., 1986: The Atmosphere: An Introduction to Meteorology. Reproduzido com permissão de Prentice Hall, Upper Saddle River, N. J., 07458.)

O sistema terra/atmosfera/oceâno pode ser considerado como um enorme motor termodinâmico que usa energia do Sol como combustível, convertendo-a em diferentes formas, e devolvendo-a ao espaço sideral. A intensidade dos raios solares que atingem o "topo" da atmosfera é de 1380 Wm-2. Mais energia é disponível à zôna equatorial do que às zônas mais próximas dos pólos.
Um cálculo simples mostra que a potência dessa máquina é de 1,76 x 1011 Megawatts. Uma usina de energia para uma grande cidade não ultrapassa 100 MW de potência, logo o Sol produz energia equivalente a 2 bilhões de tais usinas terrestres.

Potência radiativa do Sol.
Essa energia solar é absorvida preferencialmente nas baixa latitudes, nos trópicos e subtrópicos. Ela é transportada dos trópicos para as regiões polares como energia térmica ou calor latente na forma de vapor d'água. Eventualmente, essa energia é irradiada de volta para o espaço em quantidade equivalente ao que chega, dando ao sistema terra/atmosfera/oceâno um equilibrio termodinâmico.
O aquecimento global que será discutido mais adiante no curso não é uma questão de ganhar mais energia do que perda, mas sim uma questão de redistribuição de energia na atmosfera. Não se observa a Terra se aquecendo ou resfriando rapidamente, e mesmo que se modifique a composição dos gases em nossa atmosfera não se modifica o fato da Terra perder a mesma quantidade de energia que recebe do Sol. Mudando-se os gases da atmosfera terrestre, muda-se os processos de redistribuição: a superfície se aquece, mas a estratosfera se esfria.

Transporte e radiação.
Energia atinge a superfície da terra em grande quantidade na região tropical e subtropical. Isso favorece um fluxo de energia na atmosfera e nos oceânos dessas regiões para os pólos. A água dos oceânos se aquecem nas regiões tropicais e se movem na direção dos pólos como acontece com a corrente do Golfo do México, transportando enorme quantidade de calor para as latitude maiores. Se não fosse pela presença dessa corrente, a escandinavia teria temperatura cerca de 10°C mais baixa do que a temperatura atual. Também pela atmosfera a energia é transportada na direção dos pólos pela circulação global. Uma maneira sutil de transportar energia para as latitudes maiores é pelo calor latente da água que evapora nas regiões tropicais e é levado pela atmosfera em direção aos pólos. Quando o vapor d'água volta para a fase liquida, há liberação da energia usa no processo evaporativo. As regiões polares perdem mais energia para o espaço do que aquela que recebem do Sol, e isto tem que ser compensado pelo transporte de energia dos trópicos.
Fluxo radiativo vs. latitude.
Os oceâno cobre 71% da superfície terrestre, e 90% da parte terrestre restante está no hemisfério norte. É importante observar que o continente antartico forma uma calota na região polar, mas no pólo norte não há equivalente porção de terra.
Uma figura da temperatura média do ar próximo da superfície em Janeiro mostra linhas de mesma temperatura, que são chamadas de isotermas, geralmente seguem as linhas das latitudes, principalmente no hemisfério sul. Nas áreas continentais, nos dois hemisférios, as isotermas mostram tendências de seguir a direção norte-sul. Nessa época, o hemisfério sul está no verão, e a terra está mais quente do que o oceâno porque a terra se aquece mais com os raios solares.
No hemisfério norte, Janeiro corresponde ao inverno, e o deslocamento das isotermas para o sul significa que a terra está mais fria que o oceâno, na mesma latitude.

Temperatura média da superfície em Janeiro. (Fonte: Howard J. Critchfield, General Climatology, 3rd ed., 1974 by Prentice-Hall,Inc.)
Para Julho, as isotermas médias mostram deslocamento para norte nos dois hemisférios devido à terra ser mais aquecida que o oceâno na mesma latitude no hemisfério norte, e mais fria no hemisfério sul.
Temperatura média da superfície em Julho.
(Fonte: Howard J. Critchfield, General Climatology, 3rd ed., 1974 by Prentice-Hall, Inc.)
A distribuição vertical da temperatura média mostra que a superfície da terra tem temperatura próxima de 288 K. A temperatura diminui com a altura acima da superfície cerca de 10 km. Esse nível é chamado de tropopausa e marca o limite superior da troposfera. Acima dessa altura, na estratosfera, a temperatura permanece constante e próxima de -55°C até mais ou menos 20 km, acima do qual a temperatura aumenta até um máximo por volta de 5o km. Essa descrição é uma figura idealizada do perfil da temperatura da atmosfera. Nas regiões polares a tropopausa não passa de 8km, e nos trópicos ela pode atingir 17 km. É importante observar que a tropopausa é mais fria na região tropical onde a temperatura pode ser de -80°C.
Estrutura e temperatura da atmosfera.
Essa estrutura de temperatura é muito crítica para o movimento de umidade e gases traços na atmosfera. Na troposfera o ar é muito misturada. Umidade, poluentes, ou gases traços que são injetados na atmosfera, na superfície, são misturados na troposfera em 2 a 3 dias. Os processos de precipitação geralmente eliminam as partículas solúveis dentro de 1 a 3 semanas. No entanto, se tais substâncias entram na estratosfera pode permanecer ali de 1 a 3 anos. Por exemplo, a fumaça dos poços de petróleo durante a guerra do golfo pérsico ficou confinada na troposfera e foi eliminada antes de atingir regiões mais distantes, enquanto grande quantidade de poeiras de erupções de 1991 do Monte Pinatubo, nas Filipinas, foi injetada na estratosfera e esta reduziu o nível de radiação solar em todo o planeta por 3 anos. O fato da estratosfera ser muito estável e não permitir mistura será discutido na unidade de ozônio.
Vimos que as regiões recebem mais energia por unidade de tempo do que as regiões polares, e que esta energia é redistribuida pelo movimento da atmosfera e dos oceânos. Para entender isto, necessitamos rever o efeito da rotação da terra sobre o movimento do ar dos oceânos. Se por um momento esquecermos que a gira em torno de seu eixo, então o excesso de energia nos trópicos faz subir o ar mais leve, menos denso. No processo de subida o ar local é substituido por ar vindo dos pólos. Sobre a América do Norte, uma corrente vinda do norte levaria ar polar para a região equatorial, e o ar superior circularia no sentido contrário levando calor, formando uma célula de circulação. Um padrão semelhante ocorreria no hemisfério sul.
Circulação global numa terra sem rotação.
(Lutgens, F.K., and Tarbuck E. J., 1986: The Atmosphere: An Introduction to Meteorology. Reproduzido com permissão de Prentice Hall, Upper Saddle River, N. J., 07458.)
Na realidade, como se observa movimentos relativos a locais fixos na terra, a rotação da terra cria uma força aparente no movimento de qualquer objeto ou fluido. Essa é a força de Coriolis. No hemisfério norte ela exerce uma força perpendicular e para o lado direito, defletindo o movimento nessa direção. No hemisfério sul o deslocamento é para a esquerda. Portanto, o ar se deslocando em direção ao equador resulta em ventos persistentes na superfície tendo direção nordeste no hemisféerio norte, e direção sudeste no hemisfério sul.
Isso cria o que se chama de região subtropical de alta pressão ao redor de 30° norte e sul do equador, e isto mostra porque em alta altitude o ar não vai diretamente para as regiões polares, mas é defletido e desce novamente para a superfície.

Cinturão de vento e pressão ao redor da Terra. (Lutgens, F.K., and Tarbuck E. J., 1986: The Atmosphere: An Introduction to Meteorology. Reproduzido com permissão de Prentice Hall, Upper Saddle River, N. J., 07458.)
No lado polar dessa célula de circulação em cada hemisfério há outra célula que gira na direção oposta: na superfície o ar se move em direção ao pólo, e em alta altitude o ar vai em direção aos trópicos. Isso conduz a ventos geralmente de oeste nas latitudes médias (30° to 60°), norte e sul. Nos Estados Unidos, geralmente o movimento dos sistemas atmosféricos é no sentido oeste - leste. Nas latitudes maiores que 60o, existe uma terceira célula de circulação com ventos na superfície vindos dos pólos, e na direção dos pólos para os ventos em altitude. A força de Coriolis cria, na superfície, geralmente ventos de leste nas altas latitudes.

Se você se recorda da animação dos movimentos das nuvens (1.0 MB) do exercício da Internet, você deve ter observado movimentos leste - oeste das nuvens nas regiões tropicais, enquanto que nas latitudes médias eram de oeste para leste. Porque a descrição da circulação global anterior foi simpificada, pode haver exceções ocasionais nos movimentos. Nos trópicos, o ar aquecido na superfície pode chegar até 10 km de altura. No processo de ascenção o ar se esfria, e quanto mais alto for a altura mais se resfriará. De fato, as temperaturas mais baixas na baixa atmosfera não estão nos pólos, mas nos trópicos, na base da estratosfera. Chuvas intensas resultantes da subida do ar elimina grande quantidade da umidade, portanto o ar se deslocando em direção dos pólos é bem seco. O ar descendo no cinturão de alta pressão ao redor de 30° norte e sul, é comprimido e se esquenta. Nessa latitude, o ar quente e seco não produz nuvens resultando em regiões ensolaradas e secas, até em desertos. Um mapa da vegetação (Julho, 1995) mostra falta de vegetação nessas latitudes.
Nas latiutdes intermediárias o tempo e o clima são dominados pelo movimento dos ventos de oeste nos cinturões tanto no hemisfério norte como sul. Essa região é o campo de batalha entre as massas frias que vêm das regiões polares e as massas quentes dos trópicos. O limite entre essas duas massas de ar na superfície define a posição e o carater das frentes (frias, quentes, estacionárias). Na tropopausa, essa separação marca a posição da corrente de jato, uma corrente de ar que move com alta velocidade e que se move paralela à separação dessas massas de ar, de oeste para leste. Ar frio, denso, vindo das regiões polares de vez em quando caminham em direção ao equador, arrastando consigo a frente junto à superfície e a corrente de jato acima.
Esquema idealizado da relação da frente polar com os cinturões de vento e pressão ao redor do mundo. (Donn, W. L., 1975: Meteorology. McGraw-Hill, Inc., New York, NY. 518 pp.)
A corrente de jato está ligada com os padrões de tempo na superfície pelos padrões de convergência e divergência horizontal. Um gráfico da corrente de jato mostra que as linhas de fluxo se juntam em algumas regiões gerando fluxos mais rápidos. Essas regiões estão associadas com correntes descendentes nas latitudes intermediárias e zônas de alta pressão na superfície onde o ar é forçado a girarno sentido horário pela força de Coriolis. Por sua vez, regiões de divergência em altitude tendem a sugar o ar da superfície formando centros de baixa pressão na superfície. Se o ar ascendente estiver quente e úmido, ao subir produzirá precipitação normalmente associada com centros de baixa pressão. Previsão do tempo é então uma tentativa prever como se desenvolvem esses centros de baixa pressão. Porque as características do tempo na superfície está fortemente associada com o fluxo em altos níveis elevados, o primeiro modelo de previsão de tempo delineado e usado pelos matemáticos e meteorologistas foram feitos para prever as características e movimentos das latitudes intermediárias, no nível de 500 mb ou 5 a 6 km acima da superfície. Os padrões e movimentos dessa região dá fortes indicações a respeito das condições de tempo na superfície.
Diagrama idealizado mostrando a relação entre os fluxos próximos da superfície e em altitude. (Lutgens, F.K., and Tarbuck E. J., 1986: The Atmosphere: An Introduction to Meteorology. Reproduzido com permissão de Prentice Hall, Upper Saddle River, N. J., 07458.)
O fluxo persistente sobre oceânos quentes nas regiões tropicais carregam muita umidade para as regiões de convergência. Um mapa global das chuvas mostra que as áreas tropicais recebem muita chuva ao redor da Zôna de Convergência Intertropical (ZCIT). Algumas regiões têm mais de 5 000 mm de chuva anualmente. Esses detalhes de chuvas serão revistos quando for discutido o fenômeno El Niño.
Distribuição da chuva média anual sobre os continentes.(Trewartha, G. T., 1968: An Introduction to Climate. McGraw-Hill, Inc. New York, NY, 408 pp.)
A circulação atmosférica também controla os padrões de chuva nos cinturões subtropicais de alta pressão, próximos dos 30° norte e sul. E o movimento e o desenvolvimento de zônas de baixa pressão ao longo do limite frontal nas latitudes médias governam as chuvas nessas regiões. Comparando mapas globais de chuva e vegetação revela a importância do total de chuva na determinação do nível de produção biológica. Mesmo deste ponto de vista geral, pode-se ver que mudanças nos padrões de circulação global e de chuvas pode ter impactos significantes na vegetação global. Esse tema será considerado quando o ciclo de carbono planetário for abordado, e também as práticas de uso da terra nas diversas regiões.

Distribuição dos tipos de clima nos continentes. (Trewartha, G. T., 1968: An Introduction to Climate. McGraw-Hill, Inc. New York, NY, 408 pp.)

Chuva média anual sobre o oceâno Pacífico tropical. (Adaptado de R. C. Taylor, 1973: An Atlas of Pacific Islands Rainfall, Hawaii Institute of Geophysics.)
Padrões regionais de chuva podem ser governados por processos peculiares nao ligados à circulação global. No meio-oeste norte-americano, por exemplo, as chuvas de verão têm padrão bem diferente do restante do país, e isto pode ser visto no mapa que mostra o horário de ocorrências. Outras regiões norte-americanas têm chuvas do meio do dia para a tarde, em resposta ao aquecimento da superfície e à evaporação que conduz à formação e desenvolvimento vertical de nuvens com ocorrência de chuvas. No meio-oeste, no entanto, as chuvas são mais frequentes durante a noite. A grande enchente que ocorreu durante o verão de 1993 produziu as chuvas mais pesadas depois do pôr do Sol. A razão para isto é que o meio-oeste sofre o que se chama complexos convectivos de meso-escala (MCC). Esses sistemas de grande escala originam-se à tarde, a oeste das Grandes Planícies americanas e chegam no meio-oeste depois do pôr do Sol. Ao invés de se dissiparem após a perda do aquecimento solar no pôr do Sol, esses MCC adquirem mais umidade da corrente de jato de baixa altitude que vem do sul e que funcionam como um carreador de umidade desde o Golfo do México. A intensificação dessa corrente após o pôr do Sol aumenta as tempestades da tarde na região das planícies e faz com que elas persistam e aumentem enquanto se movem pelo meio-oeste depois do pôr do Sol.
Chuva noturna durante o verão no meio-oeste norte-americano.
Esses processos de chuva regional não são totalmente compreendidos, e também não se sabe como serão afetados pela mudânça climática global devido ao efeito estufa. Estimativas de como os padrões de chuva mudarão devido ao aquecimento global estão entre as maiores incertezas nas projeções das mudânças climáticas. E devido à forte ligação entre padrão global de chuva e ocorrência de vegetação, as projeções do impacto na agricultura e sistemas naturais também são bastante incertas.

Traduzido por Antonio Roberto Pereira